Cuidado! Os capitalistas estão a aproveitar-se dos ingénuos!
Cuidado! Os capitalistas estão
a aproveitar-se dos ingénuos!
(ou, dito de outra maneira,
não há nada a fazer…)
O mundo, leia-se os governos, os
investidores e, claro que sim, os povos, demoraram a perceber os riscos que o
planeta corre (e os seres humanos também) se continuarmos a usá-lo como se não
houvesse amanhã. E, com isso, abrimos um caminho para o fim dos amanhãs
possíveis.
Acredito que, depois de passada a
onda poluidora que, fundamentalmente depois da primeira revolução industrial,
se abateu sobre o planeta, mais centena de milhar de ano, menos centena de
milhar de ano, tudo recuperará. Nós, espécie humana, é que corremos sérios
riscos de não estar cá para ver. E, à nossa dimensão bem relativa, em que cem
anos nos parecem muito tempo, o fim do mundo em que sempre acreditámos pode bem
ser possível ainda na nossa geração ou, no melhor dos cenários, na geração dos
nossos filhos e netos.
Os culpados, claro está, são sempre
os outros. As grandes empresas poluentes, os governos mais preocupados em jogos
de favorecimento económico, permitindo mega-investimentos que ajudam a
deteriorar o ambiente, poluindo os solos, os rios, o mar e o ar que respiramos.
São também culpados todos os que,
sem qualquer preocupação ambiental, se atiram diariamente a largas centenas de
gramas de carne de vaca (ou de outros animais), contribuindo assim para atirar
para a atmosfera enormíssimas quantidades de metano. Para os mais comedidos,
aqueles que acreditam que em cada um de nós há uma vítima inocente, os culpados
são apenas os que produzem as megatoneladas de carne e nos convencem a
consumi-la.
Enquanto nos preocupamos em
encontrar culpados, aquecemos a casa, tomamos o nosso banho diário e, dado que os
transportes públicos funcionam mal, fazemos quilómetros atrás de quilómetros de
casa para o trabalho e do trabalho para a casa.
E, apesar do estado a que as
coisas estão a chegar, angustiados por deixar uma casa imprópria para viver aos
nossos filhos, reproduzimo-nos. Ter filhos não é apenas uma possibilidade
genética, nem sequer uma imposição judaico-cristã. É um desígnio supra-humano.
É um imperativo de espécie, assente no princípio de que o domínio se consegue
ocupando o espaço, uma espécie a priori racional em toda a espécie. Um ponto
comum entre cada um de nós e os insignificantes vírus ou as terríveis vespas
asiáticas.
Adiante. Passaram os anos e, talvez
porque o ar que respiramos se tornou menos respirável, talvez porque não nos é
indiferente verificar a substituição das conchas da praia por restos do nosso
lixo urbano, talvez porque, milagre da comunicação global, os desastres
naturais do outro lado do mundo nos entram em casa como se nossos e os nossos
hão de chegar ao outro lado do mundo, começamos finalmente a compreender a
urgência do problema.
Nem todos, é certo. Alguns,
porventura herdeiros da velha tradição esotérica da teoria da conspiração,
insistem que tudo não passa de um chorrilho de mentiras, alinhavado por
cientistas corruptos (a grande massa vendida ao novo imperialismo verde) e que,
basta puxar pela memória, sempre houve cataclismos, cheias e secas, tufões e tornados.
São os mesmos que nos lembram que o petróleo e o carvão (e a eficaz energia
nuclear) são energias limpas (muito menos destrutivas que um qualquer vulcão)
e, por isso, não há necessidade nenhuma de procurar alternativas.
Por isso importa denegrir os
(ainda poucos) Al Gores que vão surgindo e destruir a imagem das Gretas (e os
pais por tabela) que vão, apesar de tudo, aumentando os decibéis da causa.
A nova moda é agora culpar o
sistema capitalista (o mesmo que se encarregou de destruir metodicamente o
planeta) de ter interesses financeiros na mudança do paradigma.
Os primeiros culpados começaram
por ser os produtores de baterias elétricas dos novos automóveis que se diziam
verdes. E, nas redes sociais, alimentados por telemóveis de nova geração, eles
próprios movidos a energia armazenada nas suas pequenas baterias, pululam os
acusadores, argumentando que os veículos elétricos poluem muito mais que os
velhos e convencionais motores a diesel. E que produzir eletricidade para
carregar as mesmas baterias também polui.
Talvez porque a batalha
fundamentalista parece dar os primeiros sinais de estar perdida, mudam-se as
agulhas da crítica e acusam-se as grandes companhias (essas que estão cotadas nas
bolsas mundiais) de estarem por trás da cabala ambientalista. Agitam-se de novo
as bandeiras contra o capitalismo, contra a economização da sociedade,
como se o ser humano pudesse organizar-se sem equilíbrio dos números, sem uma
estrutura que lhe permita pôr em ordem os quase 6 biliões de seres humanos
espalhados pelo planeta.
A questão é mesmo essa: o
equilíbrio. Esse equilíbrio que a história nos demonstra ser difícil e
precário. Um equilíbrio que, apesar dos mais agoirentos, já fez muito caminho
desde a idade das cavernas até aos dias de hoje.
Não nego que, em muitos lugares
do mundo, alguns estados se assemelham a esses tempos cavernícolas. Não se pode
negar, porém, que noutros lugares o ser humano atingiu um ponto de dignidade e
de direitos que parece (visto do dealbar do século XXI) a anos luz dos inícios
do século passado.
Voltando por isso à questão da
urgência da transformação energética e dos nossos estilos de vida. A questão
que se põe é simples: acreditamos ou não que o planeta está em risco (ao menos
o planeta que nos habituámos a conhecer)? Queremos ou não mudar os nossos
comportamentos e realizar o primeiro R da tríade verde: Reduzir? Seremos
capazes de Reutilizar o que já pensávamos velho e gasto e, por último, é
mesmo possível Reciclar, produzindo tão só e apenas e o que puder mais
tarde ser reciclado?
Faltam alguns R’s. Resistir.
Será que conseguimos fazer tudo isso e resistir às convulsões que uma mudança industrial
profunda, delapidadora de postos de trabalho e (não há como negá-lo) de
rendimentos individuais e das famílias pode provocar na sociedade?
A única forma de resistir é Repensar
o modelo de sociedade. Não podendo destruir o modelo capitalista (a história já
nos provou que não tem sido fácil, dado tratar-se de um modelo camaleónico que,
quando acossado, seduz e se incorpora nos ideais dos seus detratores), importa
transformá-lo, domesticá-lo.
Para isso é urgente colocar o
poder económico ao serviço das energias que acreditamos serem mais limpas,
trabalhar com ele para construir a imagem (desejavelmente real) de que produzir
mais limpo pode ser rentável.
Mas, não tenham dúvidas, até
porque se trata de um problema de sobrevivência da espécie humana, é urgente
repensar o poder do próprio indivíduo. E porque sozinho nenhum ser humano tem o
necessário poder de transformação, é urgente repensar o papel do estado.
Não podemos continuar a “deixar
estar, deixar passar”. Precisamos de aumentar o escrutínio sobre tudo o que se
passa. Colocar a inteligência ao serviço das pessoas e das empresas.
Só assim, cada um de nós, em
sociedade, pode garantir que a velha mentira não venha a ser substituída por uma
nova.
Por isso, não tenho dúvidas: a
economia verde vai tornar-se apetecível. O capitalismo vai olhar para ela com
os seus grandes olhos gulosos e nós… mais vale investir em estados mais fortes,
em uniões de estados com os mesmos desígnios e aproveitarmos.
Pode ser que amanhã o mar ainda
seja azul.
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